Quem nestes dias lê os jornais, assiste a noticiários de TV, ou acessa portais de notícias da Internet (para não falar de blogs), se depara com inúmeras matérias relativas às próximas eleições americanas.E não é muito difícil perceber que as preferências, as simpatias, as complacências dirigem-se quase sempre a Barack Obama.Obama é apresentado como carismático, alguém que vai trazer uma "mudança". Uma "mudança" para os Estados Unidos e o mundo, uma "mudança" que ninguém é capaz de precisar, mas que parece quase mágica.Um despacho da France Presse até asseverava que a "Obamania" invadiu o mundo, mas essa popularidade não significa que suas idéias sejam conhecidas.8 Leia Obama e a mudançaEnquanto todas as simpatias midiáticas se dirigem, com evidente parcialidade, ao candidato democrata, todas as antipatias e até desprezos se dirigem ao campo conservador, ao candidato McCain e, sobretudo, a sua vice, Sarah Palin. Esta última tem sido alvo de ataques que, se dirigidos a outra pessoa, facilmente seriam qualificados de preconceituosos.Curiosamente, muitos daqueles que torcem hoje, de maneira desalmada, por Barack Obama, são aqueles mesmos que alimentam um antiamericanismo doentio. Afirmam que o candidato democrata acabará com a "estupidez" americana.Afinal quem pode deslindar estas contradições? Esse antiamericanismo é mesmo antiamericano, ou se volta apenas contra um modo específico de ser americano? O que significa mesmo a "estupidez" americana? Será um modo de ser, pensar e agir que desagrada a um esquerdismo ora explícito, ora difuso, que acaba por influenciar muitos ingênuos?Em artigo publicado na Folha de S. Paulo (31.out.2008), sob o título Dilemas do antiamericanismo, Dom Bertrand de Orleans e Bragança, Príncipe Imperial do Brasil e tetraneto de Dom Pedro I, esclarece muitas dessas dúvidas:
"De partida para os Estados Unidos, onde proferirei palestra no encontro nacional de "supporters" da TFP norte-americana, decidi debruçar-me sobre o fenômeno do antiamericanismo.Na minha juventude, os Estados Unidos espargiam pelo mundo um intenso fascínio. A americanização estampava-se nos modos de ser, vestir e se comportar de muitos de meus contemporâneos.A nação norte-americana era portadora de uma modernidade que arredava a tradição considerada "démodé". Uma atmosfera de otimismo e despreocupação inconseqüentes, de progresso risonho, envolvia seu povo e conquistava o mundo.Hollywood tornara-se foco desse modo de ser felizardo, auto-suficiente, um tanto vulgar e igualitário e moralmente tolerante.Vieram as batalhas culturais dos anos 60 e 70, que culminaram simbolicamente com a derrota no Vietnã. Tal derrota, sofrida mais no campo interno do que na frente de batalha, fruto da propaganda e da mentalidade libertária e pacifista, causou um abalo na estrutura psicológica do norte-americano e assinalou uma inflexão decisiva na sua história.Tais inflexões não se dão de chofre nem têm como determinante um único fato. Elas germinam, estendem suas raízes, desabrocham e se consolidam ao longo de anos, às vezes, décadas. Mas determinados acontecimentos têm o condão de cristalizá-las.Derrotado, o americano médio se encontrou diante do infortúnio, o qual traz muitas vezes consigo a reflexão saneadora e salvífica.Enquanto nas profundidades da mentalidade americana se operava uma rotação fundamental, permanecia, em larga escala, a propensão ao gozo da vida, à displicência, ao comodismo, que se traduzia, ante a ameaça da hecatombe nuclear que assombrava o clima propagandístico da Guerra Fria, no slogan capitulacionista: "Melhor vermelho do que morto".O espírito derrotista levou norte-americanos a queimar sua própria bandeira, num sinal público de menosprezo e hostilidade em relação aos valores que constituem o fundamento da nação.Mas a metamorfose que se gestava nas profundidades foi emergindo com força incoercível, consolidando, segundo me parece, uma das transformações psicopolítico-sociais de maior vulto na história contemporânea. Em amplos e importantes setores da nação norte-americana brotou um conservantismo político, um senso de coerência, honra e pugnacidade, a par de tendências profundas, saudosas da tradição, tonificantes dos valores familiares e ávidas dos princípios perenes da civilização cristã. Tal transformação incidiu igualmente nas escolhas da linguagem, dos trajes, das maneiras, das residências, dos objetos de utilidade ou de decoração etc.Curioso é notar que, paralelamente a tal mudança, o antigo fascínio pelos Estados Unidos foi sendo substituído por um sentimento de acrimônia e até mesmo de hostilidade. O antiamericanismo passou a ser militante em vastos círculos dirigentes e difuso em certas camadas do público.Os Estados Unidos, considerados outrora fonte da modernidade, passaram a ser apontados como retrógrados e obliterados, e contra eles se alimentaram parcialidades, má-vontades e intransigências.No presente momento, um fato desconcertante irrompe em cena. Esses focos de propaganda e militância antiamericana são agitados por um verdadeiro oba-oba pró-Barack Obama: o homem da "mudança", de uma "mudança" que ninguém se abalança a definir, nem ele próprio, mas que esses círculos parecem almejar para os Estados Unidos e o mundo.Como esse antiamericanismo rançoso se transmuta e se torna pró-americano? Dou-me conta de que ele não constitui uma manifestação simplista de nacionalismo ou de antiimperialismo, mas traz involucrada profunda animadversão ideológica. Volta-se contra um certo tipo de EUA.Revela um mal-estar ante o fato de parte muito considerável e dinâmica da sociedade americana (com forte pujança entre os jovens) ter aderido a tendências, ideais e princípios conservadores, no sentido mais amplo do termo.A torcida pelo candidato democrata é, para mim, sintoma do desejo desenfreado de certas máquinas político-propagandísticas de inverter essa conjuntura. A eventual vitória de Obama será o fruto de uma gigantesca operação de propaganda, à qual não faltaram ingredientes variados, até turbulência financeira. Mas terá ela a capacidade de alterar a realidade profunda da opinião pública norte-americana?"
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